https://youtu.be/xmVHMVSSZuc
Ao menos no trecho do livro que você me enviou, Frank Viola comete alguns equívocos clássicos da teologia com viés de liderança eclesiástica, como é o caso de acreditar na existência de apóstolos ainda em nossos dias. E não podia ser diferente, pois no trecho do livro "Quem é tua cobertura?" ele insiste em colocar os crentes sob o comando de um tipo de clero, que ele chama de "obreiros apostólicos". Com uma aparência mais moderninha certamente, mas clero assim mesmo. Vou comentar alguns destes equívocos no texto que você me enviou.
"No entanto , a Escritura menciona outros póstolos aparte dos doze. Paulo e Barnabé (Atos 14:4,14; 1 Cor. 9:1-6), Tiago, o irmão do Senhor (Gál. 1:19), Timóteo e Silas (1 Tes. 1:1; 2:6) são somente alguns dos apóstolos que aparecem nas páginas do NT. O ministério apostólico, portanto, continuou depois da morte dos doze apóstolos originais." (Frank Viola).
Primeiro, é importante entender que dos cinco dons mencionados em Efésios 4:11 (apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e doutores), os dois primeiros eram os únicos com autoridade para trazer uma mensagem de primeira mão, isto é, uma revelação de Deus. Foram eles que nos legaram as Escrituras do Novo Testamento.
Segundo, principalmente no caso dos apóstolos, eles tinham uma autoridade que nenhum cristão tem hoje, como era o caso de entregar a Satanás um cristão desobediente para a destruição da carne, conforme Paulo ordena em 1 Co 5:3-5, o que felizmente pode não ter sido preciso pelo que lemos em 2 Co 7, que parece indicar que houve arrependimento da parte do malfeitor. Porém este não foi o caso em Atos 5, quando Ananias e Safira são mortos por sua mentira.
Eu pergunto: quem hoje teria a pretensão de afirmar ter recebido uma revelação inédita e direta do Senhor, como Paulo fez? Tirando os pregadores de TV que pedem dinheiro por "revelação divina", ninguém mais ousaria fazer isso. E quem hoje teria autoridade para ordenar que alguém fosse entregue a Satanás para a destruição da carne (morte física)? Estas eram apenas duas das prerrogativas de um apóstolo.
O autor está equivocado ao tentar provar a continuidade dos apóstolos usando o caso de Barnabé (At 14:4, 14 e 1 Co 9:1-6), que tem uma missão especial designada pelo Espírito Santo em alto e bom som, conforme já comentei neste link: http://www.respondi.com.br/2010/03/barnabe-era-apostolo.html
O versículo que ele cita em Gl 1:19, que supostamente colocaria Tiago na condição de apóstolo, pode ser melhor entendido se não nos esquecermos de que Paulo era, ele próprio, um apóstolo. A frase "e não vi a nenhum outro dos apóstolos [referindo-se a si mesmo], senão a Tiago, irmão do Senhor" pode ter o sentido de não ter visto ninguém além de Tiago. Faz todo sentido pensar que Paulo estivesse dizendo "Além de mim, não vi a nenhum outro dos apóstolos, mas só vi Tiago, irmão do Senhor". (mais adiante explico porque não creio que Tiago, irmão do Senhor, fosse apóstolo). Ou também pode ser o caso de ele estar se referindo a Pedro, que é um dos visitados conforme diz o vers. 18. Veja o contexto:
Gál 1:18-19 Depois, passados três anos, fui a Jerusalém para ver a Pedro, e fiquei com ele quinze dias. E não vi a nenhum outro dos apóstolos, senão a Tiago, irmão do Senhor.
Quanto a 1 Ts 2:6 que Frank Viola tenta associar a 1 Ts 1:1 para parecer que Paulo está se referindo a Silvano e Timóteo ao dizer "nós apóstolos", me parece uma interpretação forçada. Ou Paulo está falando de apóstolos no sentido genérico daqueles que viram o Senhor e receberam deles este dom, ou está se referindo a uma missão especial, que estendia temporariamente o valor das credenciais, como ocorreu com Barnabé.
A condição para ser um apóstolo é muito clara nas páginas das Escrituras, portanto, a menos que a Palavra de Deus contenha contradições, o que é impossível, precisamos entender estas passagens dentro de seus respectivos contextos de missões especiais. O apostolado exigia pelo menos três condições essenciais:
- Ter visto o Senhor pessoalmente (1 Co 9:1; 2 Co 12:2).
- Ter sido escolhido e enviado diretamente pelo Senhor (Lc 6:13; Jo 6:70; At 9:15; 22:21).
- Ter sido testemunha de Sua ressurreição (At 1:22; 1 Co 15:8, 15).
Barnabé não aparece nos evangelhos acompanhando o Senhor, mas apenas depois da igreja já formada: "José, cognominado pelos apóstolos, Barnabé (que, traduzido, é Filho da consolação), levita, natural de Chipre, Possuindo uma herdade, vendeu-a, e trouxe o preço, e o depositou aos pés dos apóstolos". At 4:36, 37. Que ele não era um dos apóstolos fica claro pela indicação de ter depositado o dinheiro aos pés dos apóstolos.
Tiago era irmão do Senhor, e obviamente conhecia o Senhor, e aparece nos evangelhos, porém na condição de incrédulo: Joã 7:5 "Porque nem mesmo seus irmãos criam nele". E Timóteo, que Paulo chama de "meu verdadeiro filho na fé" deve ter ouvido o evangelho do próprio Paulo para ser considerado filho na fé, ou seja, bem depois de o Senhor escolher seus apóstolos e o próprio Paulo.
"Embora os apóstolos contemporâneos não estejam produzindo Escritura, eles estão comissionados divinamente para edificar o Corpo de Cristo (1 Cor. 12:28-29; Efé. 4:11). A obra principal de um apóstolo é levantar igrejas. Isto não significa que uma igreja não pode nascer sem a mão de um apóstolo. As igrejas de Antioquia da Síria, Cesárea, Tiro e Tolemaida não parecem ter sido fundadas por algum. Mas todas estas igrejas receberam ajuda de um obreiro apostólico depois de seu nascimento. De fato, cada igreja que se menciona no NT foi plantada ou grandemente ajudada por um obreiro apostólico... Os obreiros apostólicos são irmãos que possuem dons e que estão comissionados especialmente por Deus para realizar este trabalho (Rom. 1:1; 1 Tim. 2:7; 2 Tim. 1:11). Estes são aprovados e enviados à obra pelos crentes, quem lhes conhecem intimamente. Considere Atos 13:1-4: ". (Frank Viola).
Primeiro, ele erra ao confundir a igreja com "igrejas" ou assembleias locais. Segundo, ele erra ao determinar que a edificação do Corpo de Cristo é função dos apóstolos. Bastam poucos versículos para perceber que TODOS os dons estão envolvidos na edificação da qual os próprios cristãos são as pedras individuais.
1Co_14:12 Assim também vós, como desejais dons espirituais, procurai abundar neles, para edificação da igreja.
Efs 4:1112 E ele mesmo deu uns para apóstolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e outros para pastores e doutores, Querendo o aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério, para edificação do corpo de Cristo;
"Embora os apóstolos contemporâneos não estejam produzindo Escritura, eles estão comissionados divinamente para edificar o Corpo de Cristo (1 Cor. 12:28-29; Efé. 4:11)". (Frank Viola).
Mais um equívoco aqui: A passagem de 1 Co 12:28-29 não tem nada a ver com o que ele afirma e tampouco Ef 4:11. As duas passagens simplesmente falam do dom do apostolado, que como já vimos aplica-se às condições que mencionei. Os versículos parecem ter sido introduzidos aqui para dar peso de autoridade da Palavra de Deus, mas não basta citar versículos para tentar embasar uma afirmação se eles não tiverem nada a ver com a afirmação que está sendo feita.
Neste ponto da leitura eu já começo a pensar que Frank Viola perde o fio da meada ou não está sendo sincero, ao aplicar o mesmo artifício (de citar versículos que nada têm a ver com suas afirmações) também em outras passagens de seu livro, como esta:
"Os obreiros apostólicos são irmãos que possuem dons e que estão comissionados especialmente por Deus para realizar este trabalho (Rom. 1:1; 1 Tim. 2:7; 2 Tim. 1:11). Estes são aprovados e enviados à obra pelos crentes, quem lhes conhecem intimamente." (Frank Viola)
Depois de inventar um tipo de apóstolo que teria permanecido até os nossos dias (ou seja, fora daquelas condições bíblicas para ser apóstolo), ele passa a aplicar a estes que chama de "obreiros apostólicos" todas as passagens bíblicas que se referem especificamente a algum dos doze, além de Paulo. Vou deixar que você mesmo confira as três passagens que ele citou (Rom. 1:1; 1 Tim. 2:7; 2 Tim. 1:11) para constatar o "truque" do mágico autor. Todas as três referem-se EXCLUSIVAMENTE ao apóstolo Paulo e qualquer pessoa não hipnotizada por frases de impacto pode enxergar isso.
"Estes são aprovados e enviados à obra pelos crentes, quem lhes conhecem intimamente. Considere Atos 13:1-4". (Frank Viola)
Outro equívoco aqui. Onde ele viu que Paulo e Barnabé tenham sido enviados pelos crentes? O texto bíblico é claro em mostrar que os "profetas e doutores, a saber... Simeão chamado Níger, e Lúcio, cireneu, e Manaém, que fora criado com Herodes o tetrarca" nada mais fazem do que estender a destra em comunhão com aqueles que eram enviados pelo Espírito Santo.
O versículo 4 deixa isso claro, além do fato de que seria estranho pessoas em posições abaixo de apóstolos enviarem apóstolos (profetas e doutores são dons que vêm depois de apóstolos em Ef 4:11). Que foi o Espírito, e não os crentes, quem os enviou fica claro na passagem: Ats 13:4 "E assim estes, enviados pelo Espírito Santo, desceram a Selêucia e dali navegaram para Chipre".
Aparentemente o autor confunde o enviar, que só pode vir do Senhor, que dá dons aos homens para tanto, com o poder que os apóstolos tinham (porque reuniam um dom com um ofício de autoridade) de solicitar que um irmão fosse aqui ou ali resolver algumas coisas específicas, como Paulo faz com Tíquico em Ef 6:21. Quem lê os evangelhos irá se lembrar de que, no sentido de capacitação, os trabalhadores da seara do Senhor não são enviados por homens, mas pelo próprio Senhor:
Luc_10:2 "E dizia-lhes: Grande é, em verdade, a seara, mas os obreiros são poucos; rogai, pois, ao Senhor da seara que envie obreiros para a sua seara".
Creio que o que comentei até aqui já basta para perceber que o próprio fundamento dos argumentos que o autor apresenta no livro cai por terra quando é puxado o tapete da premissa de que hoje ainda existiriam apóstolos. Em Atos 20, ao se despedir dos anciãos em Éfeso o apóstolo Paulo não os encomenda a supostos futuros apóstolos para cuidarem da obra depois de sua partida, mas a Deus e à Palavra. E Pedro em sua despedida em 2 Pd 1 apenas diz que providenciaria para que os discípulos se lembrassem das coisas que disse, e não que haveria outro para substituí-lo.
Acredito que Frank Viola faria um grande favor à verdade se apenas indicasse que o primeiro passo para um crente andar de acordo com a Palavra de Deus em termos de igreja seria ele apartar-se do mal religioso (2 Tm 2:18-22), saindo do "arraial" religioso (Hb 13:13). Se ele realmente entendesse isso não colocaria em seu site uma propaganda do tipo: "Se você gostaria de convidar [contratar] Frank para falar em sua conferência ou igreja... clique aqui". O link leva para uma página que mostra que o autor possui dois "produtos". Um mais genérico, com temas sobre a comunhão individual com Cristo, e outro que trata de suas ideias de como congregar.
Minha pergunta é: Se você fosse pastor de uma denominação, iria contratar alguém que fosse à sua igreja dizer que você deveria procurar outro emprego? Talvez sim, se existisse um acordo de cavalheiros e o palestrante se comprometesse a oferecer a seus fiéis apenas o "Tema 1". E se você fosse o palestrante, realmente comprometido com sua crença de que a cristandade como um todo tornou-se semelhante ao arraial judaico, iria aceitar um convite para entregar uma mensagem mais água com açúcar em uma denominação religiosa? Não, você realmente procuraria ser coerente e manter-se apartado de tudo isso, seguindo "a justiça, a fé, o amor, e a paz com os que, com um coração puro [purificado ou livre dessas coisas], invocam o Senhor" 2 Tm 2:22.
Quando Paulo encontrou irmãos que procuravam diluir sua fé associando-se aos judaizantes que existiam entre os cristãos, advertiu-os severamente. Eles deviam permanecer apartados de tudo aquilo, e não tentar melhorar o judaísmo ou adaptá-lo ao cristianismo. Só posso deduzir, pela posição do autor, que ele não entendeu a profundidade do mal que é o sistema eclesiástico e a necessidade de apartar-se dele, inclusive fisicamente não participando de suas conferências e igrejas. Se ele mesmo fizesse isso, daria um ótimo exemplo de coerência. Mas aí seria exclusivismo demais não é? E quem disse que o Senhor não quer exclusividade?
Gál 2:11-18 "E, chegando Pedro à Antioquia, lhe resisti na cara, porque era repreensível. Porque, antes que alguns tivessem chegado da parte de Tiago, comia com os gentios; mas, depois que chegaram, se foi retirando, e se apartou deles, temendo os que eram da circuncisão. E os outros judeus também dissimulavam com ele, de maneira que até Barnabé se deixou levar pela sua dissimulação. Mas, quando vi que não andavam bem e direitamente conforme a verdade do evangelho, disse a Pedro na presença de todos: Se tu, sendo judeu, vives como os gentios, e não como judeu, por que obrigas os gentios a viverem como judeus? ... Porque, se torno a edificar aquilo que destruí, constituo-me a mim mesmo transgressor".
Eu sei que você admira o Frank Viola e existe sim um grande mérito por ele denunciar muitas práticas erradas do cristianismo institucional. Porém não sou o primeiro a detectar no ensino dele que, se com um lado da boca ele fala contra o posto que o tradicional "pastor" (que não existe na Bíblia) ocupa nas denominações, com o outro ele prega a instituição de uma nova forma de controle, que é o "obreiro apostólico", igualmente inexistente na Palavra de Deus. Um controle muito mais centralizado, já que não se trata de uma administração local, como ensina a Palavra e e feita por meio de anciãos, mas um controle externo itinerante.
Segundo Frank Viola em seu livro "Reconsiderando o odre", uma igreja nos moldes corretos teria esta característica: "Gasta a maior parte de seus recursos com 'os pobres entre vocês' e com obreiros e missões apostólicas" (pág. 108 da versão em PDF).
A tradução em português não faz jus ao original que diz: "Spends most of its resources on 'the poor among you' and apostolic workers"
Ou seja: a igreja que ele propõe "gasta a maior parte de seus recursos com 'os pobres entre vocês' e com os obreiros apostólicos" ( e não "missões apostólicas" como traduziram no português).
Deu para perceber que o que ele propõe não é diferente de outros grupos que seguem uma linha "apostólica" que existem por aí, que praticam uma espécie de supervisão geral.
Desculpe desapontá-lo com meus comentários, mas você perguntou o que eu achava do trecho do livro que enviou e eu disse o que acho. Posso ver claramente o embrião de um sistema clerical velado na pessoa desses "obreiros apostólicos itinerantes". No meu ver, tirar o convencional "pastor" protestante convencional para colocar um "obreiro apostólico" é trocar seis por meia dúzia. Tira-se um clero institucionalizado para substitui-lo por outro igualmente sem fundamentação bíblica, já que não temos mais apóstolos nos dias de hoje.
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