https://youtu.be/if9EEIyov_4
O cristão não é deste mundo, mas também não é um alienado que sequer saiba o que está acontecendo ao seu redor. Uma vez um irmão brasileiro conheceu nos Estados Unidos um irmão de lá, quando na época o presidente era Jimmy Carter. O irmão norte-americano era tão parecido com o presidente dos Estados Unidos que o brasileiro não se furtou a comentar: "Uau, você se parece com o Jimmy Carter!", ao que o americano respondeu: "Quem é Jimmy Carter?".
No meu entender a alienação e ignorância podem fechar portas para o testemunho cristão. O Senhor Jesus estava atento aos acontecimentos de seus dias quando comentou "dos galileus, cujo sangue Pilatos misturara com os seus sacrifícios" e "daqueles dezoito, sobre os quais caiu a torre de Siloé e os matou" (Lc 13:1-4). O apóstolo Paulo não era um ignorante da cultura grega, quando citou seus poetas, ao dizer aos gregos: "Também alguns dos vossos poetas disseram: 'Pois somos também sua geração'" (At 17:28).
Qualquer conhecimento mínimo de economia, cultura, geografia, arquitetura, religião, sociologia ou política pode servir de gancho para levar uma conversa para aquilo que realmente importa: testemunhar de Cristo. Paulo não precisou estudar profundamente a idolatria grega; bastou ter um olhar observador e atento para levar a Verdade àquele povo pagão e idólatra. Em sua visita a Atenas, estando no meio do Areópago, declarou: "Passando eu e vendo os vossos santuários, achei também um altar em que estava escrito: AO DEUS DESCONHECIDO. Esse, pois, que vós honrais, não o conhecendo, é o que eu vos anuncio." (At 17:23).
Quando Davi montou seu "ministério" um dos grupos de pessoas que escolheu era de homens que sabiam discernir sua época, e acredito que esta qualidade também seja útil a um cristão: "Ora, este é o número dos homens armados para a peleja, que vieram a Davi, em Hebrom, para lhe transferirem o reino de Saul, segundo a palavra do Senhor... dos filhos de Issacar, conhecedores da época, para saberem o que Israel devia fazer, duzentos chefes e todos os seus irmãos sob suas ordens" (1 Cr 12:23; 32).
O homem que Deus escolheu para levar o evangelho a reis e príncipes não foi um Pedro pescador, mas um Paulo que podia circular nessas esferas sem se deixar intimidar, seduzir ou influenciar pelo status de seus interlocutores. Antes Deus já tinha levantado, para pedirem a liberação do corpo de Jesus, a Nicodemos e José de Arimateia, homens ilustres da sociedade judaica, que tinham acesso garantido ao governador Pôncio Pilatos.
Ao longo da Bíblia temos muita informação política, pois reis e governantes são continuamente mencionados para situar no tempo o contexto do que está sendo dito, e isso não se limita ao Antigo Testamento ou aos Evangelhos, mas continua em Atos e nas epístolas. Eu precisaria arrancar várias páginas do Novo Testamento se dissesse que não me interesso por política.
A chegada de Cristo ao mundo teve repercussões políticas e sua morte também. O cenário político teria também impacto nos primeiros cristãos e isso continuaria ao longo da história do testemunho cristão na terra profetizado nas sete cartas de Apocalipse, quando sete estágios desse testemunho são ali apresentados em relação com o grau de seu envolvimento com a política e as coisas que são de homens.
No Antigo Testamento tudo tinha relação com política, porque Deus havia estabelecido um povo na terra — Israel — para se assenhorear das outras nações e inclusive fazer valer seus direitos pela espada. Por causa de sua rebelião e idolatria, Israel perdeu seu mandato de governar o mundo com um "rei de reis", tendo esse poder e autoridade passado por Deus aos gentios, começando por Nabucodonosor que seria depois sucedido por outros grandes reinos até o dia quando o "Rei de reis" vier estabelecer seu reino.
Nos evangelhos ainda vemos uma intervenção política ativa de um profeta que representava o Antigo Testamento em sua transição, João Batista, interferindo até nos relacionamentos amorosos de um governante. Mas o próprio Jesus não se deu ao trabalho de tentar mudar o regime romano que se estabelecera na Judeia, tratando apenas de denunciar a ruína do povo que outrora Deus escolhera para representá-Lo aqui, o qual chegou a transformar o Templo de Deus em covil de ladrões.
A partir de Atos, quando a Igreja foi formada, os cristãos passaram a ser não mais que espectadores e figurantes numa peça na qual o único impacto que têm é pela sua presença como "sal e luz". Assim como esses elementos têm influência no mundo, os cristãos agem sem agir, e mesmo assim causam um impacto maior do que teria qualquer político com poder de puxar o gatilho atômico. O cristão é cidadão celestial e sabe que é Deus quem põe e tira reis, portanto não cabe a ele interferir no processo para não se fazer culpado de estar agindo na contra-mão do que Deus quer para este mundo.
Mesmo assim cristãos estiveram infiltrados em todas as esferas da sociedade da época do início da Igreja. Nós os encontramos nas prisões e nas forças armadas, como foi o caso de Paulo que testemunhou ali para "toda a guarda pretoriana" (Fp 1:13), até nos altos escalões do governo, então a corte romana, "especialmente os da casa de César" (Fp 4:22). Onde você lê "casa de César" leia "família de César" porque é este o sentido.
Pode imaginar o impacto que teve o evangelho talvez ouvido na prisão por algum oficial romano que, depois de convertido, o tenha levado até o círculo familiar mais íntimo do homem mais poderoso do mundo, o imperador de Roma? Você conseguiria ter esse impacto fazendo política? Não. Você conseguiria ter esse impacto sendo cristão e testemunhando de Cristo? Sim.
Ao participarmos do cenário político apenas como "observadores", como aqueles jornalistas e especialistas que nos enviam notícias do exterior sem interferir nelas, aprendemos a "conhecer a época" como faziam os servos de Davi para entendermos que às vezes Deus permite um Napoleão ou Hitler como a Sua vara, como permitiu que um Nabucodonosor invadisse a terra outrora prometida ao povo que Deus chamou de "menina dos olhos" para levá-lo cativo à Babilônia.
Os problemas começam quando saímos da posição de figurantes ou pessoas que querem apenas se manter informadas e entender sua época, e passamos à militância ativa como atores de algum partido ou ideologia política, e somos seduzidos pela crença de que temos algum poder de mudar o mundo pela eleição da pessoa certa. O problema é que a pessoa certa será aquela que Deus colocar no poder, e isso nem sempre para a felicidade do povo. Ao contrário do dito popular e dos anseios democráticos de nossa sociedade, a voz do povo NÃO É a voz de Deus.