https://youtu.be/HNpapx0y8nk
Você pergunta se a Bíblia é um manual confiável para o homem, mas eu diria que ela é sim confiável, mas não particularmente PARA O HOMEM, mas a respeito DO HOMEM JESUS. Mas primeiro vamos tratar da dificuldade que você tem por ter ouvido dizer que a Bíblia estaria cheia de erros, e algumas chegaram a essa conclusão pelo fato de as versões que existem não serem baseadas no texto original, porém em sucessivas cópias de manuscritos. Considerando que os manuscritos que deram origem à Bíblia foram copiados muitas vezes, existiria a possibilidade de alguém ter feito alterações nessas cópias. Alguns alegam que a igreja católica teria reservado os manuscritos originais, produzindo outros para introduzir neles os erros.
Outra alegação é a de que a Bíblia também não seria digna de crédito por não ser um documento histórico, e sim um conjunto de lendas, ideias e costumes de uma época. Outros dizem que a Bíblia não serve para uma civilização tão moderna e bem instruída quanto a nossa. Segundo estes, ela podia ter sido muito boa para controlar as civilizações selvagens e bárbaras da antiguidade, porém em nossos dias não precisaríamos de um livro assim, já que teríamos atingido um grau mais elevado de evolução e esclarecimento. Resumindo, estas e outras opiniões tentam de várias formas minar a legitimidade deste livro que conhecemos como a Palavra de Deus, e muitas vezes estes ataques partem daqueles que se dizem teólogos, especialistas em grego e hebraico etc.
No primeiro capítulo do Evangelho de Lucas encontramos: “Tendo, pois, muitos empreendido pôr em ordem a narração dos fatos que entre nós se cumpriram, segundo nos transmitiram os mesmos que os presenciaram desde o princípio e foram ministros da palavra, pareceu-me também a mim conveniente descrevê-los a ti, ó excelentíssimo Teófilo, por sua ordem, havendo-me já informado minuciosamente de tudo desde o princípio, para que conheças a certeza das coisas de que já estás informado.” (Lc 1:1-4).
Lucas escreveu o seu evangelho e o livro de Atos dos Apóstolos, porém ambos são praticamente um só texto e foram escritos em sequência cerca de 30 ou 40 anos após o desenrolar dos fatos descritos ali. Muitos alegam que tudo o que foi escrito naquela época, ou seja, os evangelhos, as cartas e o livro de Apocalipse, seria fruto da imaginação de seus autores. Mas quando lemos o início do Evangelho de Lucas notamos logo que ele escreve como se fosse um repórter, um jornalista. Antes de criar o texto que leva o seu nome, ele diz ter entrevistado pessoas, conversado com muitos, e procurado investigar se era aquilo mesmo que tinha acontecido.
A minha convicção, e também de muitos cristãos, é que os evangelhos foram escritos por inspiração divina, mas sabemos que Deus usou homens para escrevê-los. É possível perceber isto claramente pela diferença de estilo entre os diferentes evangelhos, entre as diferentes cartas dos diferentes apóstolos, enfim, entre todos os livros que compõem a Bíblia. Foram homens que a escreveram, porém divinamente inspirados.
Alguns acham que escrever por inspiração divina seja algo como ver a mão do escriba se movendo sozinha como se ele entrasse numa espécie de transe mediúnico e recebesse assim a mensagem vinda de Deus. Mas não é o que acontece. Deus usa o ser humano integralmente e o mantém no pleno controle de seus sentidos. “Os espíritos dos profetas estão sujeitos aos profetas”, escreve Paulo em 1 Coríntios 14:32. O Espírito Santo de Deus inspirou as palavras na mente dos diferentes escritores da Bíblia como se as ditasse em forma de pensamentos audíveis, e fez com que cada profeta ou apóstolo as escutasse da maneira como elas foram ditadas.
Ao falar desse processo de inspiração palavra a palavra, Paulo explica assim: “Deus no-las revelou [as palavras] pelo seu Espírito; porque o Espírito penetra todas as coisas, ainda as profundezas de Deus... As quais [coisas] também falamos, não com palavras de sabedoria humana, mas com as [palavras] que o Espírito Santo ensina, comparando as coisas espirituais com as espirituais.” (1 Co 2:10-13).
Em diversas passagens do Antigo Testamento encontramos Deus dando uma ordem direta aos seus profetas e dizendo coisas como “escreve num livro todas as palavras que [EU] te tenho falado.” (Jr 30:20). Mesmo assim cabia ao homem a responsabilidade de transformar as palavras ditadas pelo Espírito de Deus em um texto fiel às suas intenções. E este cuidado fica claro no modo de Lucas proceder guiado pelo Espírito Santo. A introdução de seu evangelho mostra que, embora inspirado, seu texto é também um documento histórico, não uma mera lenda.
J. R. R. Tolkien, autor de “O Senhor dos Anéis”, foi uma das maiores autoridades do mundo em lendas europeias, tanto é que seu livro traz muito desse seu conhecimento transformado em um romance épico. “O Senhor dos Anéis” é uma imensa mescla de lendas. Tolkien era também cristão e conhecedor da Bíblia. Outro autor, seu amigo e colega de ensino, era C. S. Lewis, um ateu. Lewis alegava que os evangelhos não passavam de um conjunto de lendas, porém Tolkien, com seu conhecimento do assunto, explicou a ele que os textos não traziam qualquer característica de lenda, uma vez que para se formar uma lenda é preciso tempo e, principalmente, a ausência de testemunhas para contestar a sua veracidade.
Os evangelhos, porém, formam um conjunto de fatos registrados enquanto seus protagonistas e a maioria das testemunhas ainda viviam. Não faria sentido alguém escrever uma lenda quando ainda existia tanta gente capaz de contestar o que havia sido escrito. Quando o apóstolo Paulo fala da morte e ressurreição de Cristo no capítulo 15 de sua primeira carta aos Coríntios ele menciona que mais de quinhentas pessoas tinham visto Cristo ressuscitado, e a maior parte delas ainda vivia quando escreveu sua carta. É difícil você enganar um número tão grande de pessoas com uma lenda.
Tudo nos evangelhos nos leva a crer que seus autores narraram os fatos exatamente do modo como eles ocorreram. O tempo passado entre os acontecimentos e seu registro era muito pequeno para a narrativa ser considerada uma lenda. Além disso, os evangelhos são tão ricos em pormenores que seria impossível alguém escrever uma lenda com tamanha riqueza de detalhes.
Existem outras coisas importantes a serem consideradas. Quando você cria uma lenda, ou compõe um romance, o herói de sua história dificilmente será alguém como Jesus, que é o tema central dos evangelhos. Nós o vemos antes da cruz em agonia por saber o que viria sobre si, dizendo: “Pai... afasta de mim este cálice.” (Mc 14:36). Da mesma forma, dificilmente os autores do texto falariam de seus próprios defeitos, como alguns fazem nos evangelhos. Nos evangelhos e no livro de Atos temos os apóstolos e outros discípulos fazendo coisas que não são propriamente corretas.
Como Pedro poderia falhar como falhou? E como iria permitir que suas falhas ficassem registradas se elas não fossem realidade? Qualquer outro teria maquiado situações constrangedoras, como fizeram com a história do Brasil que estudamos na escola. Hoje sabemos o quanto ela foi alterada para que seus heróis fossem apresentados como íntegros e irrepreensíveis. Até mesmo as biografias de homens famosos trazem muitas partes inventadas ou alteradas, para não deixarem transparecer o que seus personagens realmente eram. Por estas e outras razões não existe fundamento para dizermos que os textos bíblicos são uma obra meramente humana ou uma lenda.
Mais um detalhe deve ser considerado. Se os evangelhos não passassem de lendas judaicas do primeiro século, a primeira coisa que seus autores fariam seria colocar homens como testemunhas da ressurreição de Cristo, jamais mulheres. Isto porque, na sociedade daquela época, as mulheres não eram tomadas como testemunhas, a menos que aquelas mulheres tivessem realmente visto a ressurreição de Jesus, caso contrário os autores dos evangelhos não teriam registrado aquilo do modo como fizeram. Quando alguém diz que a Bíblia não serve para os nossos dias está, obviamente, tirando conclusões a partir da cultura em que vive.
Na passagem do capítulo 24 do Evangelho de Lucas encontramos dois discípulos caminhando decepcionados, pois confiavam que Jesus seria aquele que libertaria Israel. Enquanto eles conversam com o próprio Jesus, sem que o tivessem reconhecido, um deles diz: “Nós esperávamos que fosse ele o que remisse Israel”. Eles enxergavam a vida, morte e ressurreição de Cristo dentro do contexto cultural no qual estavam inseridos. Desde a infância aqueles dois homens haviam sido ensinados que o Messias viria para libertar Israel e agora eles falavam disso para o próprio Messias ressuscitado que tinha vindo com uma missão muito mais ampla do que simplesmente libertar Israel; aquele que tinha vindo salvar pecadores. Eles estavam diante de uma Pessoa e de um evento muito maior. Mas isso eles não conseguiam enxergar através das lentes culturais que traziam.
Mesmo dentro do condicionamento cultural em que vivemos você encontrará limitações para se entender a amplitude daquilo que a Bíblia ensina. Experimente mostrar a um jovem, criado no Ocidente, o que dizem os evangelhos e as cartas dos apóstolos sobre as relações sexuais, que devem ocorrer apenas no matrimônio e entre um homem e uma mulher. É bem provável que o jovem ocidental rejeite tal ideia. Ele dirá que isso era para o primeiro século, não para hoje, quando existe liberdade para as pessoas terem relações sexuais fora do casamento e inclusive entre pessoas do mesmo sexo. Mas se você mostrar outra coisa que Jesus ensinava, por exemplo, perdoar os inimigos, esse jovem ocidental dirá: “Ah, com isso eu concordo; é politicamente correto amar, perdoar, não revidar etc.”. Veja que das mesmas páginas você consegue extrair dois assuntos, um que é refutado imediatamente por alguém criado em uma cultura ocidental moderna, e outro que é imediatamente aceito pela pessoa dentro da mesma cultura.
Agora tente mostrar estes mesmos assuntos tirados da Bíblia para um fundamentalista islâmico e a reação será inversa. Ele irá concordar com a parte do Novo Testamento que ensina que as relações sexuais devem ficar restritas ao casamento e que sexo entre dois homens ou duas mulheres seria uma aberração. Porém, não irá concordar com a ideia de perdoar um inimigo e a considerará até absurda, pois no islamismo ele foi ensinado de acordo com a velha máxima da Lei mosaica que dizia: “Vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé, queimadura por queimadura, ferida por ferida, golpe por golpe.” (Êx 21:23-25) . Portanto, considerando apenas duas culturas já é possível perceber que cada uma irá enxergar a Palavra de Deus dentro do seu contexto cultural e ambas acabarão rejeitando o completo teor da Bíblia, apesar de concordarem com fragmentos de seu ensino.
Outro tema normalmente usado pelos céticos e pelos que se opõem à fidelidade da Bíblia é o da escravidão. Se a Bíblia fosse a Palavra de Deus, como ela poderia admitir a escravidão ou não combatê-la? O problema é que quando encontramos servos ou escravos na Bíblia, logo pensamos na escravidão no Brasil e em outros países no período colonial. Os escravos dessa época eram pessoas negras, sequestradas na África, discriminadas pela cor da pele e tratadas como animais. É assim que enxergamos a escravidão, pois é assim que ela está inserida em nossa memória cultural. Mas se você voltar no tempo aprenderá que os escravos nos tempos bíblicos não eram nem um pouco parecidos com os do Brasil colônia. Eles não eram diferenciados pela cor de sua pele e podiam até pertencer ao povo de Israel. Um israelita podia dar-se a si mesmo como escravo para o pagamento de uma dívida, e também recuperar sua liberdade mediante pagamento. Portanto, estamos diante de um modelo de sociedade completamente diferente do que conhecemos.
Por esta razão, não é tarefa simples pegar uma Bíblia e dizer que ela está errada, como fazem muitos céticos e inimigos da Palavra de Deus. Nosso referencial é por demais influenciado pelo contexto cultural em que vivemos para que nossa conclusão sobre a Bíblia seja imparcial. Querer julgar a Bíblia por aspectos como os que mencionei aqui denota, além de ignorância, uma boa dose de soberba daquele que tenta fazê-lo, pois o ser humano sempre achará que a sua cultura está acima de todas as outras como referencial.
As pessoas de minha geração se lembram do modo como nos vestíamos nas décadas de 1950 e 1960, e das gírias que falávamos. Hoje nossos filhos riem das roupas que veem nas fotos antigas, mas para nós elas eram a última moda. Naquela época achávamos que o nosso modo de vestir devia ser o referencial adotado por todos, e zombávamos das roupas dos mais velhos do mesmo modo como a geração atual zomba das roupas que usávamos quando éramos jovens. Mas logo virá uma próxima geração e será ela que irá rir dos costumes dos jovens de hoje. Portanto, ainda que nenhuma cultura seja permanente, a Bíblia é permanente. E ela deve permanecer tendo este caráter, mesmo que algumas coisas nela nos deixem intrigados, nos desagradem ou estejam fora de nossa compreensão.
Os homens tentam adaptar a Palavra de Deus aos seus interesses e o resultado é sempre ridículo. Nos Estados Unidos existe uma edição da Bíblia da qual foram excluídas todas as passagens ruins, como as que falam do lago de fogo e da condenação eterna. Apenas as palavras bonitas, agradáveis e politicamente corretas foram deixadas. O problema é que as pessoas que fizeram essa edição se consideraram mais sábias que o próprio Deus, quando ousaram dizer o que estaria correto e o que não estaria. No momento em que alguém decide julgar o que é certo e o que é errado essa pessoa acaba assumindo a função de Deus, caso seja ela ou sua opinião o referencial adotado.
É mais ou menos como um casamento. Imagine você se casar com uma pessoa que concorde com tudo o que você diz. Você diz que gosta de azul, e ela concorda. Você gosta de feijão, e ela adora feijão. Você decide pintar a casa de uma determinada cor e ela diz que sempre sonhou em ter uma casa assim. A princípio pode parecer muito bom viver com uma alma gêmea nos mínimos detalhes, mas não demoraria muito para você achar que estava vivendo com uma pessoa sem personalidade. A opinião dela seria igual à sua nos mínimos detalhes, o que seria o mesmo que você se casar com um clone. Chegaria um momento quando nem mesmo haveria diálogo entre vocês, pois um saberia de antemão o que o outro iria falar e estaria de acordo de qualquer maneira.
Deus quer ter um relacionamento com você, mas não nas bases que você estabelecer, e sim nas bases que ele estabeleceu. E se ele realmente é Deus e a Bíblia a Sua Palavra, esta não irá concordar com você em tudo. Se concordasse, não seria mais a Palavra de Deus, e sim de alguém idêntico a você, com os mesmos gostos, as mesmas ideias e opiniões. É importante entender isto, pois quando você entende, percebe que não terá o poder de julgar a Bíblia, mas será ela o gabarito pelo qual você será julgado. “Porque a palavra de Deus é viva e eficaz, e mais penetrante do que espada alguma de dois gumes, e penetra até à divisão da alma e do espírito, e das juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e intenções do coração. E não há criatura alguma encoberta diante dele; antes todas as coisas estão nuas e patentes aos olhos daquele com quem temos de tratar.” (Hb 4:12-13).
Portanto, a Bíblia, a Palavra de Deus, denuncia quem nós realmente somos e não gostamos nem um pouco disso. Ela revela que somos pecadores, descendentes de seres criados por Deus que um dia decidiram viver segundo a própria vontade e por isso mergulharam na ruína. Se você duvida que o ser humano é intrinsicamente mau, abra o jornal de hoje para ver a quantas anda o mundo habitado por uma humanidade avessa a Deus. Algumas pessoas ainda dizem que se Deus existisse, que se Deus fosse realmente bom, o mundo não estaria assim. Realmente, se o ser humano tivesse permanecido submisso a Deus para que ele dirigisse todas as coisas, o mundo não estaria do jeito que está. Mas o homem excluiu a Deus de seus planos e o resultado está aí para ninguém poder contestar.
Outro argumento bastante frágil contra a Bíblia é dizer que a igreja católica teria escondido os manuscritos originais e produzido outros, a partir dos quais teria sido elaborada a Bíblia que temos em mãos. Para aceitar tal argumento você precisaria ter acesso aos originais para comparar, o que nem mesmo os adeptos dessa teoria alegam possuir. A verdade é que a Bíblia que temos foi produzida a partir de muitas cópias de muitos manuscritos e nem todos se encontram no Vaticano. A maioria dos manuscritos e fragmentos, nos quais se baseia o texto bíblico, está fora de Roma, em universidades e museus de todo o mundo, e em grande medida eles concordam entre si.
Hoje é possível você pegar, por exemplo, o livro de Isaías de sua Bíblia, o qual foi traduzido de uma cópia de cópias dos originais, e compará-lo com o manuscrito descoberto em 1947 nas cavernas de Qumran próximas ao Mar Morto. Naquele ano um pastor de ovelhas descobriu uma série de cavernas que continham diversos vasos, e dentro deles muitos manuscritos. O de Isaias encontrado ali é setecentos anos mais antigo do que o que foi usado na atual versão da Bíblia e, no entanto, os textos são considerados idênticos. Ninguém sabe quantas cópias foram produzidas nos setecentos anos que se passaram entre o que foi encontrado em Qumran e o que foi utilizado em nossa Bíblia atual, mas isto já dá uma ideia da fidelidade do trabalho dos escribas e copistas da antiguidade e, acima de tudo, do cuidado de Deus em preservar a sua Palavra.
Um argumento recente que tem sido adotado por alguns cristãos e igrejas é o de que a Bíblia não é a Palavra de Deus, mas apenas contém a Palavra de Deus. Os que defendem tal argumento dizem, por exemplo, que quando Satanás diz algo a Eva, ou os amigos de Jó lhe dão conselhos equivocados, ou Salomão fala de filosofia humana em Provérbios e de coisas terrenas em Eclesiastes, isso não seria palavra de Deus, mas palavras do diabo e de homens. O que esses não entendem é que essa informação, ou seja, o que o diabo e esses homens disseram, não teria chegado até nós se Deus não tivesse nos contado tudo isso. Portanto, a Bíblia é sim a Palavra de Deus, inclusive naquilo que Deus está dizendo que outros falaram.
Como você pode perceber, os argumentos levantados contra a Bíblia costumam ser bastante frágeis quando examinados com o devido cuidado. O que não podemos é ter medo deles e adotar a postura de quem prefere nem ouvir falar do assunto. Podemos confiar que Deus teve o devido cuidado de preservar este livro que se denomina a si mesmo de “Palavra de Deus” para que nós tivéssemos acesso a ele séculos ou milênios após seus textos originais terem sido produzidos.
Agora quero voltar à questão de a Bíblia não ser um manual PARA O HOMEM, mas ser a respeito DO HOMEM JESUS, embora encontremos nela muitos ensinos de como termos uma vida feliz neste mundo e também de como encontrar o caminho da salvação. No Evangelho de Lucas, após a ressurreição de Jesus você encontra dois discípulos o questionando, porém sem o reconhecerem porque seus olhos estão espiritualmente vendados: “És tu só peregrino em Jerusalém, e não sabes as coisas que nela têm sucedido nestes dias?” (Lc 24:18). Os discípulos estavam limitados em seus pensamentos. Eles falavam das mulheres, que tinham tido uma visão de anjos dizendo que Jesus estaria vivo. Tudo aquilo os deixava confusos, porém Jesus os repreende: “Ó néscios, e tardos de coração para crer tudo o que os profetas disseram! Porventura não convinha que o Cristo padecesse estas coisas e entrasse na sua glória?” (Lc 24:25-26).
Jesus não apenas mostra que os profetas do Antigo Testamento eram dignos de crédito em tudo o que haviam escrito, e vai além ao revelar ser ele, Jesus, o tema central das Escrituras: “E, começando por Moisés, e por todos os profetas, explicava-lhes o que dele se achava em todas as Escrituras.” (Lc 24:27). Se ele começou por Moisés, que escreveu o Pentateuco, os cinco primeiros livros da Bíblia, e terminou falando de “todas as Escrituras”, fica evidente que Jesus deu o seu aval divino ao que hoje chamamos de Antigo Testamento.
Os discípulos não haviam conhecido pessoalmente os profetas do Antigo Testamento, porém para Jesus os seus escritos eram dignos de crédito e para os discípulos deviam ser também. Hoje podemos ler o profeta Isaías falando do Servo sofredor, daquele que viria irreconhecível e iria para o matadouro como ovelha muda, e no Salmo 22 Davi relata os sentimentos daquele que seria colocado entre ladrões e os detalhes de sua morte em cruz. Davi escreveu que nenhum de seus ossos seria quebrado, que em sua sede ele beberia vinagre, teria suas vestes repartidas entre os soldados e que estes lançariam sorte sobre elas.
Se para Davi e Isaías aquelas coisas eram ainda futuras, para nós é história e todas elas se cumpriram na vida e morte de Jesus. Se o próprio Senhor autenticou o testemunho dos profetas do Antigo Testamento, temos razões para crer também no testemunho dos apóstolos e profetas do Novo Testamento. O apóstolo Pedro, ao falar das cartas de Paulo, as colocou no mesmo nível das Escrituras do Antigo Testamento. Ele escreveu: “Em todas as suas epístolas [de Paulo], entre as quais há pontos difíceis de entender, que os indoutos e inconstantes torcem, e igualmente as outras Escrituras” (2 Pe 3:16).
Portanto temos as Escrituras do Antigo e Novo Testamento, mas o que fazemos com elas? Quando você dá uma Bíblia de presente a alguém, a primeira coisa que a pessoa faz é achar que aquele livro seja uma espécie de "Manual do Fabricante", e aí passa a procurar em suas páginas o que deve fazer ou como deve viver para agradar a Deus e ser recompensada com bênçãos nesta vida e na vida além. “O que devo fazer pra ser salvo? O que devo fazer pra ser feliz? O que devo fazer pra ser abençoado? O que devo fazer pra ser curado das minhas doenças? O que devo fazer para ser próspero e ganhar dinheiro?” Estas são as primeiras indagações de quem começa a ler a Bíblia. É como se tivesse nas mãos um manual do tipo “O que devo fazer”. Mas a Bíblia não é um livro escrito sobre aquele que lê. Ela certamente foi escrita para você, mas não é um livro sobre você. Toda ela é sobre Jesus. “E, começando por Moisés, e por todos os profetas, explicava-lhes o que dele se achava em todas as Escrituras.” (Lc 24:27).
No início da Bíblia encontramos os livros escritos por Moisés, um grande herói do ponto de vista humano. Devemos seguir a Moisés? Não! Moisés já nos falava de Jesus quando os israelitas ainda eram prisioneiros no Egito. Deus ordenou a eles que sacrificassem um cordeiro e passassem seu sangue sobre os batentes exteriores das portas das casas onde viviam. Aquele cordeiro era uma figura de Cristo, pois séculos mais tarde, no Novo Testamento, isso fica claro quando João Batista aponta para Jesus e diz: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo.” (Jo 1:29).
Se continuarmos voltando no tempo, até Adão e Eva, descobriremos que Adão foi colocado num sono profundo, o seu lado aberto, e uma costela tirada a partir da qual Deus criou uma esposa para ele. Cristo na cruz foi colocado no sono profundo da morte, o seu lado foi rasgado pela lança do soldado e dali saíram o sangue da expiação e a água da purificação que expiam o pecado do pecador e o deixam apto para ter acesso à presença de Deus sem ser destruído. Foi do lado aberto de Jesus que saíram os elementos necessários para Deus formar aquela que é a Igreja, a noiva de Cristo.
Nos tempos de Moisés, o povo andou pelo deserto carregando a “Arca da Aliança”, e aquela arca era uma figura de Cristo. Assim como Cristo andou pelo deserto deste mundo, aquela arca de madeira — figura da humanidade que vem da terra — viajava escondida sob uma cobertura de pele de animais marinhos e um tecido azul. Qualquer um podia ver em Jesus algo de celestial enquanto ele caminhava neste mundo, mas nem pecado, nem tentação alguma podia ter acesso a ele, do mesmo modo como nada podia atravessar aquela capa impermeável de peles finas que cobria a arca.
À semelhança da “Arca da Aliança”, ainda que os homens conseguissem ver o exterior de Jesus, ninguém via sua glória interior, representada pelo ouro que revestia a arca por dentro e por fora. Dentro dela estavam as tábuas da Lei dadas a Moisés, o que nos fala do único que realmente pôde cumprir toda a Lei, o Filho de Deus, perfeito, puro e sem pecado. Em sua peregrinação pelo deserto os israelitas bebiam água de uma rocha que tinha sido ferida pela vara de Moisés, e aquela rocha também era uma representação ou figura de Cristo.
Já deu para você perceber que a Bíblia inteira é sobre Cristo? Não se trata de um livro para você ter em mãos e procurar em suas páginas O QUE VOCÊ DEVE FAZER para ser salvo. Pelo contrário, a Bíblia é o livro cujas páginas mostram O QUE CRISTO FEZ POR VOCÊ. É disso que as Escrituras falam desde o princípio. O que Jesus fez para você ser salvo, o que ele fez para limpar os seus pecados, o que ele fez pra Deus lhe perdoar, o que ele fez para Deus lhe aceitar, o que ele fez para você poder ir para o céu. O QUE JESUS FEZ, NÃO O QUE VOCÊ DEVE FAZER!
Se alguém fizesse qualquer coisa em prol da própria salvação, a glória seria da pessoa e o céu estaria cheio de gente dizendo “Cheguei aqui porque fui muito honesto, dei muitas esmolas, ajudei muitas pessoas etc.”, enquanto outros diriam “Estou aqui porque fui um grande artista, muito trabalhador, um grande cientista, médico ou inventor etc.”. Todas estas coisas que nós valorizamos numa pessoa neste mundo, e que costumam ser mencionadas naquelas elogias nos velórios, seriam consideradas como créditos para a salvação. Porém no céu só existe um tipo de pessoa, aquela que diz: “Estou aqui porque Cristo morreu por mim; estou aqui porque eu era um pecador perdido e Jesus foi à cruz pagar por meus pecados, derramou ali o seu sangue para minha purificação; ressuscitou ao terceiro dia para minha justificação.”.
Lembro-me de um irmão, que pregava o evangelho numa praça na Bolívia, e foi abordado por um ouvinte, que lhe disse:
— Gostei do que você falou; achei muito bonita a sua pregação, porém só não concordei com uma coisa. Você disse que todos nós somos pecadores perdidos. Mas eu não sou pecador, sou uma pessoa que sempre fez o bem. Eu nunca pensei mal de ninguém, nunca prejudiquei ninguém, nunca matei, roubei ou adulterei. Enfim, sou uma pessoa boa e eu vou para o céu porque eu creio que Deus irá ver a minha bondade e me receberá.
O pregador comentou:
— Bem, então teremos um problema no céu. Você sabe o que vai fazer no céu?
— Não faço ideia.
— Então vou lhe contar. No livro de Apocalipse há uma cena que se passa no céu e lá todos os salvos estão cantando.
— Bem, então eu também vou cantar — disse o homem.
— Pois é aí que está o problema — continuou o pregador — Todos estarão cantando um hino de louvor a Cristo, cuja letra diz: “Digno és de tomar o livro, e de abrir os seus selos; porque foste morto, e com o teu sangue compraste para Deus homens de toda a tribo, e língua, e povo, e nação.” (Ap 5:9). Todos estarão cantando assim e você estará cantando outro hino que diz: “Digno sou de tomar o livro, e de abrir os seus selos; porque fui bom, honesto, caridoso etc. para comprar a mim mesmo para Deus.”. Percebe como você estaria cantando completamente fora do tom celestial?
Mario Persona é palestrante e consultor de comunicação, marketing e desenvolvimento profissional (www.mariopersona.com.br). Não possui formação ou título eclesiástico e nem está ligado a alguma denominação religiosa, estando congregado desde 1981 somente ao Nome do Senhor Jesus. Esta mensagem originalmente não contém propaganda. Alguns sistemas de envio de email ou RSS costumam adicionar mensagens publicitárias que podem não expressar a opinião do autor.)