https://youtu.be/4Z_J6w1plIw
Eu nunca tinha ouvido essa expressão e fui pesquisar, e encontrei como nome de música gospel, e também uma expressão usada em livros de auto-ajuda e no meio evangélico pentecostal. Encontrei também um site de uma "pastora" que explica de um modo tal que acabei achando que a expressão poderia ser traduzida em linguagem coloquial para algo como "forçar a barra".
Os exemplos que ela dá de "romper em fé" são alguém segurando uma folha de papel e você puxando com força até rasgar, decidindo que aquilo é seu e ninguém pode tomar. Aí vem aquela ladainha normal das mensagens motivacionais do tipo "Acredite!", "Confie!", "Você vai vencer!", "A vitória é tua!" e segue explicando como persuadir a Deus a fazer a própria vontade, empurrando "as portas da sala do trono de Deus", derramando "lágrimas aos seus pés" e atraindo "a mão dele para sua cabeça". Em outras palavras, se a porta não se abrir meta o pé na porta.
Também encontrei em um livro de um autor cristão que deve ser quem mais vende livros de auto-ajuda no Brasil. Lá dizia: "...precisamos romper em fé, saltar muralhas, vencer gigantes, triunfar sobre os destruidores de sonhos e não desistir jamais". E continua dizendo que não podemos aceitar passivamente a "decretação da derrota na nossa vida" (pensei em Paulo na prisão dizendo-se "prisioneiro do Senhor"), "não podemos nos conformar com o caos" e ousando afirmar que "nosso Deus não é colecionador de derrotas, é campeão invicto em todas as batalhas". Então vem: "Se Deus está conosco, então somos maioria absoluta". E por aí vai.
Eu não tenho dúvidas de que Deus é poderoso e que devemos orar e buscá-lo confiando na vitória. A carta aos Hebreus deixa claro que temos agora essa intrepidez e ousadia de entrar na própria presença de Deus, mas não diz para fazermos isso forçando a barra, metendo o pé na porta ou "rompendo em fé". Não precisamos romper nada, pois o véu que nos separava de Deus já foi rompido.
"Tendo, pois, irmãos, intrepidez para entrar no Santo dos Santos, pelo sangue de Jesus, pelo novo e vivo caminho que ele nos consagrou pelo véu, isto é, pela sua carne, e tendo grande sacerdote sobre a casa de Deus, aproximemo-nos, com sincero coração, em plena certeza de fé, tendo o coração purificado de má consciência e lavado o corpo com água pura. Guardemos firme a confissão da esperança, sem vacilar, pois quem fez a promessa é fiel... "Cheguemos, pois, com confiança ao trono da graça, para que possamos alcançar misericórdia e achar graça, a fim de sermos ajudados em tempo oportuno." (Hb 10:19-23; Hb 4:16).
Eu entendo por "tempo oportuno" o tempo de Deus, você não entende assim? Não o que é de nossa vontade, mas o que é da vontade dele e quando ele achar que seja apropriado. É assim que os pais tratam seus filhos, não dando a eles uma moto de mil cilindradas no aniversário de dois anos de idade — porque ele não teria capacidade para pilotá-la —, e nem arranjando uma garota de programa para o menino em seu aniversário de quinze anos — porque isso seria pecado diante de Deus e pode se configurar em crime.
Um dos versículos usados como argumento pelos autores que promovem o "romper na fé" é "no teu livro foram escritos todos os meus dias, cada um deles escrito e determinado, quando nem um deles havia ainda" (Sl 139:16). Aparentemente não entendem que cada um desses dias foi determinado por Deus segundo a sua vontade, e não segundo a nossa. Como iria eu achar que minha vontade é a vontade de Deus e assim "forçar a barra" ou "romper em fé" na tentativa de fazer acontecer? Poderia até ser da vontade de Deus me ajudar nesse assunto em particular, mas poderia não ser o "tempo oportuno".
Outro versículo é Isaías 43:2, "Quando passares pelas águas, eu serei contigo; quando, pelos rios, eles não te submergirão; quando passares pelo fogo, não te queimarás, nem a chama arderá em ti." O que esses autores não percebem é que no versículo anterior está claro a quem foi endereçada essa promessa de proteção de perigos terrenos: "Mas agora, assim diz o Senhor, que te criou, ó Jacó, e que te formou, ó Israel: Não temas, porque eu te remi; chamei-te pelo teu nome, tu és meu." (Is 43:1).
Quem quiser se apropriar dessa promessa terá de incluir também o que é prometido no versículo 3: "Dei o Egito por teu resgate e a Etiópia e Sebá por ti". Acaso faria sentido isso para um cristão no tempo presente? Você acha sinceramente que Deus deu o Egito, a Etiópia e Sebá para resgatar você? Eu sempre tive comigo que fui resgatado pelo sangue de Cristo, o qual foi entregue em meu lugar. O contexto todo do capítulo fala do dia em que Deus irá libertar Israel de seus inimigos para introduzi-lo no reino terrenal de Cristo.
Mas a audácia dos promotores desse "romper em fé" — ou como prefiro chamar "forçar a barra" e "meter o pé na porta" — vai além de se apropriar de passagens ditas a Israel e também se apodera de passagens do que Deus disse a Ciro, rei da Pérsia (atual Irã). Deus usou aquele grande rei como instrumento seu para decretar a volta a Jerusalém do remanescente de judeus que estava no exílio em Babilônia (2 Crônicas 36). Então, quando alguém usa para si a passagem, "Eu irei adiante de ti, endireitarei os caminhos tortuosos, quebrarei as portas de bronze e despedaçarei as trancas de ferro" (Is 45:2) está fazendo uma apropriação indevida dessa promessa. A não ser que o tal se chame Ciro e seja rei da Pérsia, o que acho muito improvável.
No mesmo capítulo as promessas de Deus a Ciro continuam: "A riqueza do Egito, e as mercadorias da Etiópia, e os sabeus, homens de grande estatura, passarão ao teu poder e serão teus; seguir-te-ão, irão em grilhões, diante de ti se prostrarão e te farão as suas súplicas, dizendo: Só contigo está Deus, e não há outro que seja Deus." (Is 45:14). Se você está achando que com o seu "romper em fé" Deus lhe dará a "riqueza do Egito, e as mercadorias da Etiópia", é bom começar a arranjar espaço em sua casa, pois no pacote vêm também "os sabeus, homens de grande estatura, passarão ao teu poder e serão teus" (Is 45:14). Os vizinhos certamente irão estranhar todos aqueles homens altos que "seguir-te-ão, irão em grilhões, diante de ti se prostrarão e te farão súplicas".
Esse "romper na fé" ou "forçar a barra" pode não ser uma atitude muito sábia para um cristão que tem temor de usar o nome de Deus em vão e de se considerar no direito de determinar como e quando Deus deve agir. Ezequias fez isso ao pedir a Deus mais quinze anos de vida, e tanto insistiu que Deus atendeu. Porém esses quinze anos adicionais foram de vergonha e ruína para o rei e seu povo (2 Rs 20). Sabe aquele conselho que o empresário dá para a banda ou para o atleta se aposentar quando está no auge? Pois é, Ezequias pelo jeito não escutou seu empresário e decidiu "romper na fé".
Nesses quinze anos Ezequias cometeu muitos erros, mas o pior deles foi ter um filho, Manassés, que tinha doze anos quando Ezequias morreu. Entronizado rei em lugar de seu pai, Manassés reintroduziu no reino a idolatria que seu pai tanto combatera, chegando até mesmo a queimar seu filho em sacrifício aos ídolos. Se o que Ezequias fez foi "romper em fé" ao insistir que Deus lhe desse mais tempo de vida, certamente ele depois se arrependeu de ter "forçado a barra".
Dizer que devemos "forçar a barra" porque temos o poder de mover o coração de Deus pela fé e por meio da oração é não entender a lição ensinada por Jesus em Lucas 11:5-13. Ali o exemplo do amigo que importuna seu vizinho foi dado apenas para mostrar que, se um vizinho importunado pela insistência para emprestar "três pães", quanto mais o Pai é capaz de atender aquele que ora a ele com fé.
Como todo exemplo manca, um bom entendedor verá que o exemplo só vai até aí, porque Deus não irá considerar uma oração de um filho seu como importunação, e nem dará de má vontade. Deus responde às nossas orações por amor, como um pai que jamais daria uma pedra para atender a um pedido de pão, ou "em lugar de peixe uma cobra, ou, se lhe pedir um ovo lhe dará um escorpião". O exemplo foi para mostrar que somos maus e que Deus é bom, portanto podemos esperar dele o melhor, ainda que não entendamos sua resposta às nossas orações, que pode ser "Sim", "Não" ou "Espere".
Quando o Senhor Jesus disse que "tudo quanto pedirdes em meu nome, isso farei, a fim de que o Pai seja glorificado no Filho. Se me pedirdes alguma coisa em meu nome, eu o farei" (Jo 14:13-14), será que esse tudo era tudo mesmo? Será que se eu pedir uma Ferrari em nome de Jesus e, "Plim!", uma Ferrari aparecerá em minha garagem? Obviamente não é bem assim, porque se fosse Deus estaria criando filhos como crianças mimadas com suas vidas desperdiçadas por concupiscências sem fim. Em João 15:7 ele explica melhor: "Se permanecerdes em mim, e as minhas palavras permanecerem em vós, pedireis o que quiserdes, e vos será feito", e em 1 João 5:14 tudo fica claro: "E esta é a confiança que temos para com ele: que, se pedirmos alguma coisa segundo a sua vontade, ele nos ouve".
Pronto, agora você já sabe que não adianta "romper em fé", sapatear, rolar pelo chão e chorar como criança mimada na tentativa de fazer com que Deus caia na sua conversa e lhe dê "a riqueza do Egito, e as mercadorias da Etiópia, e os sabeus, homens de grande estatura" (Is 45:14). A condição dada na Palavra é permanecer em Cristo e pedir "segundo a sua vontade". Ou seja, viver em comunhão com Deus para conhecer a vontade de Deus e pedir nada mais do que aquilo que ele quer dar, mas tem prazer em ver que você pede demonstrando dependência dele. Alguém já disse que se existe uma palavra mágica para se conseguir as coisas ela não é "Shazam!", nem "Abracadabra!", nem "Eu determino!", e sim "Por favor?".
Muitos cristãos que são educados o suficiente para pedir favores com cuidado e respeito parecem perder toda a educação ao tratarem com Deus, como se ele fosse um gênio da lâmpada a nosso serviço. Digo isto porque vejo alguns pentecostais dando ordens a Deus, do tipo, "Eu determino", "Eu declaro!", "Eu profetizo!". Se eu pedisse as coisas dessa maneira a meu pai ou minha mãe quando era criança, aí sim poderia esperar uma pedra em lugar de pão, um escorpião em lugar de ovo e uma cobra em lugar de peixe. Além de umas boas palmadas.
Mario Persona é palestrante e consultor de comunicação, marketing e desenvolvimento profissional (www.mariopersona.com.br). Não possui formação ou título eclesiástico e nem está ligado a alguma denominação religiosa, estando congregado desde 1981 somente ao Nome do Senhor Jesus. Esta mensagem originalmente não contém propaganda. Alguns sistemas de envio de email ou RSS costumam adicionar mensagens publicitárias que podem não expressar a opinião do autor.)