A ideia de uma atualização da Bíblia nasceu na mente daqueles que consideram os povos mais antigos menos evoluídos que os modernos. A passagem diz: "Feliz aquele que pegar em teus filhos e der com eles nas pedras." (Sl 137:9). Ora, a mim me parece que a passagem só diz que somos hoje mais evoluídos na arte de matar. Se na época dos Salmos matava-se crianças cortando-as ao meio com uma espada, como Salomão ensaiou fazer numa disputa entre mães (1 Reis 3), ou batendo sua cabeça nas pedras, como sugere este Salmo, hoje nós as matamos no útero da mãe com requintes de crueldade.
Mas não foi só nisso que ficamos mais "evoluídos". Desenvolvemos métodos mais eficazes, como matá-las sob os escombros de cidades bombardeadas, ou de forma mais instantânea, pulverizando-as com uma explosão atômica. Isto sem falar no assassinato moral que é continuamente praticado pelos novos costumes que induzem a criança a questionar se Deus agiu corretamente ao criar os seres humanos do modo como criou: "E criou Deus o homem à sua imagem: à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou." (Gn 1:27).
O apóstolo Paulo, que os teólogos modernos têm prazer em amordaçar, escreveu sobre o que Deus pensa daqueles que são sábios aos seus próprios olhos:
"Porque está escrito: Destruirei a sabedoria dos sábios, E aniquilarei a inteligência dos inteligentes. Onde está o sábio? Onde está o escriba? Onde está o inquiridor deste século? Porventura não tornou Deus louca a sabedoria deste mundo? Visto como na sabedoria de Deus o mundo não conheceu a Deus pela sua sabedoria, aprouve a Deus salvar os crentes pela loucura da pregação... Os reis da terra se levantam e os governos consultam juntamente contra o Senhor e contra o seu ungido, dizendo: Rompamos as suas ataduras, e sacudamos de nós as suas cordas. Aquele que habita nos céus se rirá; o Senhor zombará deles." (1 Co 1:19-21; Sl 2:2-4).
Mas antes que eu fuja da questão que foi levantada, vamos analisar o assunto do Salmo 137 em seu contexto, que é o da diáspora quando cerca de quarenta mil judeus foram deportados para Babilônia depois da invasão e destruição de Jerusalém. Antes já havia acontecido uma dispersão quando o reino do norte de Israel, as "dez tribos", foi tomado pelos assírios e seus habitantes dispersos pela Assíria e outros lugares. Toda essa dispersão já havia sido anunciada pelos profetas como consequência da infidelidade do povo, que abandonou o Senhor e passou a adorar deuses pagãos.
Até a pessoa mais ignorante sabe que para toda ação existe uma reação, e quando a polícia prende o criminoso e o juiz o condena, isso é visto como justiça. Um mundo sem justiça não duraria muito tempo e acabaria em anarquia, infanticídio, canibalismo e tudo mais a que o coração humano corrompido é capaz de conceber. Então fica fácil entender que o mesmo Deus, que usava nações estrangeiras para julgar e castigar seu povo, como um pai castiga seu filho, iria castigar essas mesmas nações estrangeiras pelos excessos cometidos contra a "menina dos seus olhos", como o Senhor costuma chamar o seu povo.
O Salmo 137 descreve o sentimento dos desterrados que eram obrigados a cantar canções alegres em terra estranha, mesmo com o coração ferido pela dor. "Junto dos rios de Babilônia, ali nos assentamos e choramos, quando nos lembramos de Sião. Sobre os salgueiros que há no meio dela, penduramos as nossas harpas. Pois lá aqueles que nos levaram cativos nos pediam uma canção; e os que nos destruíram, que os alegrássemos, dizendo: Cantai-nos uma das canções de Sião. Como cantaremos a canção do Senhor em terra estranha?" (Sl 137:1-4).
Ainda que o próprio Senhor tenha sido o causador daquela disciplina e sofrimento em seu povo por causa de sua infidelidade, ele não estava alheio aos excessos cometidos pelos povos que eram instrumentais nessa disciplina. Por isso ele diz: "Se eu me esquecer de ti, ó Jerusalém, esqueça-se a minha direita da sua destreza. Se me não lembrar de ti, apegue-se-me a língua ao meu paladar; se não preferir Jerusalém à minha maior alegria." (Sl 137:5-6).
Vem em seguida, não o que o Senhor diz, mas o que dizem os judeus desterrados em forma de oração e súplica por vingança: "Lembra-te, Senhor, dos filhos de Edom no dia de Jerusalém, que diziam: Descobri-a, descobri-a até aos seus alicerces. Ah! filha de Babilônia, que vais ser assolada; feliz aquele que te retribuir o pago que tu nos pagaste a nós. Feliz aquele que pegar em teus filhos e der com eles nas pedras." (Sl 137:7-9).
O sentimento de vingança é natural ao povo terreno de Deus, pois suas esperanças e desejos se limitam à vida na terra, com saúde, prosperidade, paz e proteção contra seus inimigos. Você encontrará esse sentimento de vingança em todos os livros do Antigo Testamento e também em Apocalipse, que em grande parte fala do povo terreno de Deus. Até mesmo nos evangelhos temos esse sentimento, e Pedro o demonstrou muito bem ao cortar a orelha daquele que queria prender Jesus. Você ficará surpreso por saber que o mesmo sentimento é encontrado até no céu entre as almas dos judeus martirizados pedindo vingança contra seus perseguidores nos tempos da Grande Tribulação.
"E, havendo aberto o quinto selo, vi debaixo do altar as almas dos que foram mortos por amor da palavra de Deus e por amor do testemunho que deram. E clamavam com grande voz, dizendo: Até quando, ó verdadeiro e santo Dominador, não julgas e vingas o nosso sangue dos que habitam sobre a terra?" (Ap 6:9-10).
Se continuar lendo o Apocalipse verá que grande parte dele é sobre a vingança de Deus contra os ímpios habitantes da terra culpados também de terem derramado o sangue de todos os santos em todas as eras. Quando você escuta uma mãe, que teve sua filhinha estuprada e morta, dizer ao repórter que tudo o que ela deseja é que seja feita justiça, certamente você não entende isso como se o pedófilo assassino mereça uma medalha, não é mesmo?
O sentimento de vingança não é de maneira nenhuma apropriado aos que pertencem à "nova Criação" e são membros do corpo de Cristo que é a Igreja, os cristãos que agora possuem uma nova vida e o Espírito Santo habitando neles. Se você não entender a diferença entre Igreja e Israel e estiver doutrinado pela "Teologia do Pacto", sem qualquer entendimento das dispensações, o que estou dizendo aqui ira parecer grego para você.
Menos apropriada ainda é a reação de horror expressada por incrédulos diante desse último versículo do Salmo 137, como se fosse crueldade matar crianças. Sério? Aqueles que estão dispostos a matar os próprios filhos no ventre se escandalizam?! Não deveriam, primeiro porque faz parte da configuração do homem ainda perdido em seus pecados ter sentimentos de ódio, vingança e gosto de sangue na boca. Segundo, porque a inclinação do homem natural descendente de Adão e pecador é contrária a Deus em todos os sentidos.
De onde teriam aprendido que aquilo que Deus faz como paga contra os que maltratam seu povo seria errado? Acaso discordam da mãe da menina estuprada de que deve haver justiça e castigo para o criminoso? Ora, seria impossível descrever as barbaridades que as filhas e filhos dos judeus passaram nas mãos de seus algozes na Babilônia. Se até mesmo nesta época moderna, de homens que se acham sábios e ilustres, assistimos uma das nações mais progressivas fuzilar famílias inteiras de judeus, depois de obrigá-las — homens, mulheres e crianças — a cavar suas próprias covas! Diante da crueldade dos babilônicos um judeu certamente clamaria por vingança, embora a disposição apropriada a um cristão hoje seria de misericórdia e perdão.
Mas se como cristãos de nada nos servem passagens como esta que promovem a vingança, por que não tirá-las da Bíblia? Porque a Palavra de Deus tem muito a falar também para aqueles que não são do povo terreno de Deus, e é por isso que os cristãos buscam no Novo Testamento a doutrina de como devem se comportar, mas no Antigo Testamento os princípios que norteiam os pensamentos de Deus. E existe um princípio precioso nesta passagem. Vou emprestar aqui um texto de C. S. Lewis que se aplica a esta e outras passagens:
"Sei que existem coisas em nosso íntimo que são como bebês, que acalentam comportamentos infantis de pequenas indulgências, pequenos ressentimentos, que um dia podem uma pessoa dipsomaníaca — que é o impulso ininterrupto e irresistível de ingerir bebidas alcoólicas —, ou um ódio arraigado; coisinhas que nos cortejam e nos adulam com súplicas especiais e parecem tão pequenas, tão desamparadas que, ao resistir a elas, sentimos que estamos sendo cruéis como quando maltratamos os animais. Elas começam a choramingar para nós: 'Não peço muito, mas...' ou 'Eu pelo menos esperava...' ou 'Você precisa dar um presente a si mesmo...'. Contra todas essas crianças lindas (as queridinhas sempre têm maneiras de ganhar nossa atenção), o conselho do Salmo é o melhor: Esparrame os miolos dos pirralhos. E 'bendito' aquele que puder fazer isso, pois é mais fácil falar do que fazer.".
Esta lição também está em outra passagem, que deve causar horror aos protetores dos animais, pois nos fala de matar raposas e seus filhotes: "Apanhai-nos as raposas, as raposinhas, que fazem mal às vinhas, porque as nossas vinhas estão em flor." (Ct 2:15). É claro que o homem natural moderno será cego aos princípios ensinados por passagens como esta e não saberá discerni-las. Se você entender o vinhedo como o lugar de produção do vinho "que alegra o coração do homem" (Sl 104:15) já terá caminhado um bom pedaço no entendimento da passagem. Desta vez vou emprestar um texto de Hamilton Smith:
"O Rei expressou seu desejo de ver o rosto de sua noiva e ouvir sua voz; mas assim como as raposas, com seus filhotes, estragam os vinhedos em flor, muitas vezes podem estar em ação em nosso íntimo males de natureza secreta e sutil que impedem a noiva de dar refrigério ao coração do rei. Cristo anseia pela companhia de seu povo, seu desejo é cear com eles e eles com ele. Sentar-se a seus pés e manter comunhão com ele é "a única coisa necessária" (Lc 10:41). Ele pode dispensar nosso serviço atarefado, mas ele não ficará sem nossa companhia. Maria deu este fruto agradável ao Senhor, mas Marta não. Naquele momento uma raposa a deixava infrutífera. E com que frequência nosso caso é como o de Marta. Alguma raposa — pode ser, como nossa natureza considera, uma pequena raposa — tem permissão para trabalhar despercebida no segredo de nossos corações. Orgulho, cobiça, luxúria, pensamentos rudes e amargos, murmuração e descontentamento, irritabilidade e impaciência, ciúme e inveja, ou vaidade e leviandade, podem ser permitidos sem julgamento, prejudicando a comunhão e tornando a vida infrutífera. Precisamos manter uma vigilância atenta contra as incursões dessas raposas e expulsá-las com mão cruel, caso elas apareçam.".
Mario Persona é palestrante e consultor de comunicação, marketing e desenvolvimento profissional (www.mariopersona.com.br). Não possui formação ou título eclesiástico e nem está ligado a alguma denominação religiosa, estando congregado desde 1981 somente ao Nome do Senhor Jesus. Esta mensagem originalmente não contém propaganda. Alguns sistemas de envio de email ou RSS costumam adicionar mensagens publicitárias que podem não expressar a opinião do autor.)